MALBA TAHAN |
Diz ele que, certa vez, quando um mercador voltava de Bagdad, onde fora vender peles e tapetes, encontrou um homem muito mal vestido que, gesticulando e praguejando sem cessar, chamou-lhe a atenção.
-Eu já fui poderoso! Já tive o destino nas mãos. – Esbravejava ele.
-É um pobre coitado! – Falavam uns. --Não regula bem do miolo!– Afirmavam outros.
Sentindo irresistível atração pela história do desconhecido de turbante esfarrapado, aproximou-se dele e, depois de tranquila conversação, ele lhe confidenciou:
-Eu já tive nas mãos o destino da Humanidade inteira.
Afinal, a vida de todos nós está escrita no grande livro do destino.
Cada homem tem lá sua página com tudo o que de bom ou de mau vai lhe acontecer.
Um dia, quando me encontrava vagando pelo deserto, encontrei uma gruta encantada, em cuja entrada havia um ser bondoso de sentinela.
Deixou-me entrar, avisando-me, porém, que só poderia permanecer na gruta por poucos minutos.
Dentro da gruta encontrei o tal livro do destino.
Era minha intenção alterar o que estava escrito na página de minha vida e fazer de mim um homem rico e feliz.
Bastava acrescentar: “Será um homem feliz, estimado por todos. Terá saúde e muito dinheiro”.
Lembrei-me, antes, porém, de meus inimigos.
Movido por torpes sentimentos de ódio e de vingança, procurei a página referente a um rival meu e, num ímpeto de rancor, sem hesitar, acrescentei: “Morrerá pobre, sofrendo os maiores tormentos.”
Na página de outro inimigo escrevi: “Perderá todos os seus haveres. Perderá seus amores e morrerá de fome e de sede no deserto.”
E, assim, sem piedade, fui prejudicando deliberadamente todos os meus desafetos.
Nesse momento, o mercador, que ouvia a história, não resistiu e interrompeu a narrativa.
-E na sua vida? O que você fez na página que o destino dedicara à sua própria existência?
-Ah, meu amigo, respondeu ele, torcendo as mãos nervosamente, nada fiz em meu favor.
Preocupado em fazer o mal aos outros, esqueci de fazer o bem a mim próprio.
Semeei infortúnio e dor e, por justa consequência, não colhi a menor parcela de felicidade.
Quando lembrei de mim, quando pensei em tornar feliz a minha vida, estava terminado meu tempo.
Sem que eu esperasse, algo me arrastou para longe da gruta, onde jamais consegui retornar porque nunca mais reencontrei o caminho.
Perdi a única oportunidade que tive de ser rico, estimado e feliz.
* * *
Embora se trate de uma aventura imaginária, repleta de alegorias, é certo que o triste caso encerra profundo ensinamento.
Há muitos homens no mundo que, preocupados em levar o mal a seus semelhantes, se esquecem do bem que poderiam fazer a si próprios.
* * *
Somos nós que fazemos nosso próprio destino, escrevendo diária e continuamente as páginas de nossas vidas.
Somente a nós cabe a responsabilidade pela nossa alegria ou pela nossa desdita.
Somos herdeiros de nós mesmos e colheremos justamente o que tivermos plantado.
Pensemos nisso.
Redação do Momento Espírita, com base no livro Contos
e lendas orientais, de Malba Tahan, ed. Ediouro.
Em 01.09.2015.
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