segunda-feira, 22 de março de 2021

O ÚLTIMO RETRATO

Desde a chegada da pandemia vivemos em sobressalto. 
Hoje nos chegam as notícias de um amigo, abraçado por ela e em estado crítico, no hospital. 
Ontem, foram as notas breves nos informando de familiares distantes contaminados, que a morte levou, num tempo quase recorde. 
Não pudemos comparecer para lhes ofertar algumas flores, ou ensaiar um último adeus. 
A cada notícia televisiva ou radiofônica, detalhando as milhares de mortes e de contaminados, corremos a verificar se nosso amor mais próximo está bem, se nossos filhos estão bem, nossos netos, nossos primos...
Preocupamo-nos com nossos pais e avós, de idades avançadas, cuja fragilidade os torna os preferidos dessa pandemia, que parece se eternizar. 
Quando chega a notícia de alguém querido, alguém mais próximo da nossa afetividade que se foi, quantas vezes nos surpreendemos pensando: 
-E nem me despedi direito da última vez... Se eu soubesse que ele morreria... 
Pensemos que com pandemia ou sem ela, todos os que nos encontramos na Terra estamos com o bilhete de volta no bolso. 
Uns o temos para logo mais, outros para daqui há semanas, meses, anos.
Mas, conforme assinalou Jesus, essa data, somente o Pai Celestial tem conhecimento. 
Por isso, se não temos o hábito, vamos criá-lo: o hábito de nos despedirmos com carinho, amor, toda vez que alguém sair para o trabalho, para as compras, para qualquer compromisso que lhe exija a presença. 
Os que estamos no mesmo lar, abracemo-nos, estreitemo-nos, sintamos o coração bater sincronizado com o nosso próprio compasso cardíaco. 
E digamos:
-Até logo, tchau. 
Depois, o acompanhemos com o olhar até o portão, até a saída. 
Se estiver a pé, vejamo-lo voltar-se antes de tomar a rua e acenar, mais uma vez. 
Se utilizar veículo próprio, vejamo-lo entrar no carro, colocar o cinto de segurança, ajustar o espelho retrovisor. 
Acompanhemos cada gesto. 
Detenhamo-nos à porta para observar. 
Quando, finalmente, ele ligar o motor e nos olhar outra vez, acenando, acenaremos também. 
Jogaremos beijos, sorriremos, utilizaremos as duas mãos e gritaremos uma vez mais: 
-Tchau, até logo... 
Façamos isso a cada saída de alguém, mesmo que esteja indo simplesmente comprar pão, ali na esquina. 
Se, eventualmente, esse for o último Até logo, teremos muitas fotos registradas na alma para recordar: 
-Ele sorriu para mim... Ele tornou a acenar, depois de fechado o portão, já na rua... Ele entrou no carro, mas resolveu entrar de novo e disse tchau outra vez... 
Tenhamos em mente: a vida na Terra é impermanente. 
Deixemo-nos ficar na porta, na janela, acenando um tanto mais, até a pessoa desaparecer na curva da estrada, ou no final da rua, dobrando a esquina. 
Não tenhamos pressa. 
A pandemia nos está ensinando que devemos mais e mais saborear a vida familiar. 
Que devemos prezar amigos, colegas, conhecidos. 
Que devemos valorizar a presença do outro. 
Saibamos nos despedir, demoradamente. 
Poderá ser o último retrato do amor que partirá logo mais... 
Que não venhamos a nos arrepender de não ter abraçado, beijado, aconchegado. 
O logo mais somente Deus o sabe. 
Pensemos nisso. 
Redação do Momento Espírita. 
Em 22.3.2021

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