Alguns quadros da vida nos assustam e nos levam a nos interrogarmos o que faremos quando eles nos alcançarem.
Ou como viveremos os dias da aposentadoria, da ausência de familiares e amigos que se foram, antecipando-nos na partida para a pátria espiritual.
Ao passar por um bloco de edifícios, é comum vermos um idoso alto e forte sentado em um banco em frente a um dos blocos.
Fica ali exatamente como cantam as estrofes do cancioneiro popular:
Vendo a vida passar.
Não responde ao nosso cumprimento.
De toda vez, o olhar que nos dirige parece agressivo, como quem se desencantou com a vida e sente desapontamento por ter despertado no corpo mais uma vez.
Seu semblante traduz a tristeza da solidão em que teima permanecer.
Tudo nele se manifesta dizendo que não deseja ninguém por perto.
Será assim que viveremos nossos dias futuros?
Lemos, certa feita, que a vida não gosta de monotonia.
Nada do que é, se repete.
Quando dizemos que tudo é igual, estamos redondamente enganados.
Os minutos formam horas que amontoam dias e noites, meses e anos.
Mas nada, nunca, é igual.
A chuva que despencou na madrugada infiltrou suas águas na terra, engrossou rios, lavou as ruas.
Mas essas águas não retornarão jamais.
Amanhã, poderá voltar a chover.
Serão outras remessas dos céus, em maior ou menor intensidade.
Nunca igual.
O jardim que hoje se alegrou com o despertar dos botões de rosa, amanhã mostrará cores diversas, em desabrochares múltiplos.
Os pássaros voltarão a visitar as árvores, a se banhar no chafariz improvisado em frente à nossa casa, jamais repetindo os voos, os trinados.
Como podemos, então, caminhar para a estreia da velhice como quem nada mais espera da vida, do mundo, das pessoas?
A experiência que adquirimos ao longo dos anos é inigualável.
Outros terão amontoado maiores ou menores bagagens profissionais, familiares, intelectuais.
Porém, a nossa é única.
Porque todos somos únicos.
Seres imortais, temporariamente servindo-nos de um corpo, numa Terra de transitoriedades.
Quanto temos a oferecer para a vida nos anos que nos restam.
Preparemo-nos para viver os dias sem relógio, em que poderemos fazer nosso próprio tempo.
Horário para passear, para estudar aquilo que até agora não nos foi possível, voluntariarmo-nos em uma instituição benemérita, oferecendo o que temos de bom e útil.
E que nos alegre, nos faça nos sentirmos ativos, vivos, operosos.
Quem sabe possamos nos tornar aquele idoso de olhos de criança.
Curioso, sorrindo para tudo que chega.
Ocupado demais em viver cada dia, cada novo momento como algo inesperado, algo não aguardado.
Preparado para quando o abraço da morte chegar.
No entanto, sem pressa de que ela se apresente porque, afinal, há muito ainda a contribuir neste mundo de formas, e de tantas necessidades.
Envelhecer não precisa ser sinônimo de cansaço, desânimo, desencanto.
Pode ser a estreia de novos momentos, de novas vivências, de elaborações preciosas a cada dia.
Novos e espetaculares dias.
Redação do Momento Espírita, inspirado no
artigo Só para amadores, de Cris Paz, da
revista Vida Simples, ed. 249, ano 20.
Em 29.11.2023.
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