Ela era uma senhora solitária, envolta no luto da dor, desde que o marido morrera. Vivia só, na grande casa do meio da quadra. Casa com varanda e cadeira de balanço.
Todas as manhãs, o entregador de jornais, garoto de uns dez anos, passava pedalando sua bicicleta e, num gesto bem planejado, atirava o jornal nos degraus da varanda.
Nunca errava. Paff! Era o sinal característico do jornal caindo no segundo degrau.
Então, numa manhã de inverno, quando se preparava para lançar o jornal, ele a viu.
Parada nos degraus da varanda, de pé, acenando-lhe para que se aproximasse.
Ele desceu da bicicleta e foi andando em direção a ela.
-O que será que ela quer? - Pensou o garoto.- Será que vai reclamar de alguma coisa?
-Venha tomar um café, falou a senhora. Tenho biscoitos gostosos.
Enquanto ele saboreava o lanche que lhe aquecia as entranhas, ela começou a falar.
Falou a respeito do marido, de suas vidas, da sua saudade. Passado um quarto de hora, ele se levantou, agradeceu e saiu. No dia seguinte e no outro, a cena se repetiu.
O menino decidiu falar a seu pai a respeito. Afinal, ele achava muito estranha aquela atitude.
O pai, homem experiente, lhe disse:
-Filho, ouça apenas. A senhora Almeida deve estar se sentindo solitária, após a morte do marido.
Deixe-a falar. Recordar os dias de felicidade vividos deve lhe fazer bem ao coração. É importante que alguém a ouça.
Nos dias que se seguiram, nas semanas e nos meses, o garoto aprendeu a ouvir, demonstrando interesse em seus olhos verdes e espertos.
Quando a primavera chegou, ela substituiu o café quentinho pelo suco de frutas. O verão trouxe sorvete.
Ao final, o entregador de jornais já iniciava sua tarefa pensando na parada obrigatória em casa da viúva. Habituou-se a escutar e escutar. Percebeu, com o tempo, que a velha senhora foi mudando o tom das conversas.
Como a primavera, ela voltou a florir, nos meses que vieram depois.
Quando o ano findou, o menino foi estudar em outra cidade.
O tempo se encarregaria de lecionar mais esperança no coração da viúva e amadurecer ideias no cérebro jovem.
Muitos fatores contribuíram para que o garoto e a viúva não tornassem a se encontrar. Contudo, uma lição o acompanhou por toda a vida. Ele nunca se esqueceu da importância de ouvir as pessoas, suas dificuldades, seus problemas, suas queixas.
Lição que contribuiu também para o seu sucesso como esposo, pai de família e profissional.
* * *
Saber ouvir é uma virtude. De um modo geral, nos cumprimentamos, perguntando uns aos outros, como está a saúde e a dos familiares.
Raramente esperamos por uma resposta que não seja a padrão: Tudo bem.
Normalmente, se o outro passa a desfiar o rosário das suas dores e a problemática da família, nos desculpamos apontando as nossas obrigações e quefazeres.
Entretanto, quando nos sentimos tristes, desejamos ardentemente que alguém nos ouça, que escute a cantilena das nossas mágoas.
Pensemos nisso. Mas pensemos agora, enquanto ainda nos encontramos a caminho com nossos irmãos, na estrada terrena.
Redação do Momento Espírita, com base no texto
O que aprendi com os vizinhos, de Seleções
Reader´s Digest, de abril de 1999.
Em 11.11.2019.
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