segunda-feira, 22 de janeiro de 2024

SABEDORIA DE MENDIGO

Aubrey Davis
Era uma vez uma cidade muito gelada, como gelada também era a relação entre os seus habitantes. 
Viviam isolados, cada qual em sua própria casa, indiferentes aos demais.
Um dia, um mendigo chegou à cidade. 
Sofrendo com os açoites do vento e com a fome que lhe castigava o estômago, ele bateu na porta de uma daquelas casas. 
Mal a porta se abriu, uma voz rouca espantou o pedinte, que pensou muito antes de bater na próxima casa. 
Foram mais gritos e xingamentos. 
Quando se levantou para seguir seu caminho, em busca de uma cidade mais acolhedora, percebeu que havia uma porta entreaberta. 
Era a porta do templo que se abria e fechava com o movimento do vento.
Foi entrando devagarinho... 
Encontrou o guardião do templo e seu ajudante, ambos congelados pela mesmice daquela cidade cinzenta e fria. 
Cumprimentou, limpou a garganta, provocando um ruído forçado, tentando obter alguma atenção. 
Tudo em vão. 
Então, ele falou bem alto: 
-Que pena que não poderei fazer aquela sopa quentinha, para espantar o frio e matar a fome. 
-Sopa?!, falou interessado o velho guardião. 
-Sim, eu sei fazer uma deliciosa sopa de botão de osso. São necessários seis botões, mas eu tenho apenas cinco. 
-Eu não tenho nenhum botão de osso. 
Foi a resposta. 
Mas o alfaiate poderá nos ajudar, interveio o ajudante, animado. 
A vontade de tomar uma sopa quentinha fez com que buscassem o alfaiate. 
Ali também morava a má vontade, que somente desapareceu com a palavra mágica: sopa
Ele providenciou o botão, com uma condição: iria junto para ver o milagre da tal sopa. 
O mendigo pediu também uma colher de pau, uma panela grande, uma faca, e outras coisinhas mais... 
E foi assim que o guardião do templo, seu ajudante, o alfaiate e sua sobrinha saíram pelas ruas, batendo de porta em porta para pedir os utensílios necessários para se fazer a sopa de botão de osso. 
Uma a uma, as pessoas foram se juntando, na praça, até que tudo havia sido providenciado. 
O mendigo provou e disse que a sopa estava boa mas, poderia ficar ainda melhor se alguém trouxesse um pouco de cenoura, repolho, sal, pimenta, alho, e outros ingredientes. 
As pessoas se lembravam que tinham alguma coisa em suas despensas. E mais e mais ingredientes foram surgindo. 
E todos que foram se achegando, trazendo algo mais para tornar a sopa mais substanciosa, mais deliciosa, foram se olhando, trocando ideias sobre o resultado daquela movimentação toda. 
A sopa ficou pronta. 
Todos se serviram. 
Mais de uma vez. 
Surgiu até alguém para tocar um acordeão e o povo dançou e dançou, a noite toda. 
No dia seguinte, não faltaram portas se abrindo para o mendigo se abrigar do frio. 
Como ele tinha que seguir o seu caminho, despediu-se e se foi, não sem antes deixar os botões milagrosos para que aquela população pudesse continuar fazendo a sopa. 
Muito tempo se passou. 
Os botões foram se perdendo, um a um... 
Mas todos já haviam descoberto que o verdadeiro milagre não estava nos botões, e sim na solidariedade que agora reinava entre eles. 
Esse fora o maior milagre realizado pela sabedoria de um mendigo.
Redação do Momento Espírita, com base no livro Sopa de botão de osso, de Aubrey Davis, ed. Brinquebook.
Em 22.1.2024.

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