quarta-feira, 17 de janeiro de 2024

O PÔR DO SOL E A ORQUÍDEA

RUBEM ALVES
O sol estava se pondo. 
O pôr do sol a fez lembrar-se do seu pai. 
E ela começou a falar. 
Ele estava mortalmente enfermo e sabia disso. 
Ela abandonou o seu trabalho para estar com ele. 
E conversaram sobre a partida que se aproximava, tranquilamente.
Aqueles que aceitam a chegada da morte ficam tranquilos. 
Disse-me que a hora que seu pai mais amava era o crepúsculo. 
Desde menina, ele se assentava com ela e ia mostrando a beleza das nuvens incendiadas, a progressiva e rápida sucessão das cores: azul, verde, amarelo, abóbora, vermelho, roxo... 
À medida que a morte se aproximava, a fraqueza aumentava. 
Mas, mesmo fraco, queria ver o pôr do sol. 
Talvez pela irmandade de um homem que morre e um sol que se põe.
Numa dessas tardes, ela não conseguiu conter as lágrimas. 
Chorou. 
Ele a abraçou e colocou seu dedo sobre seus lábios. 
-“Não quero que você chore...” 
E, apontando para o sol que se punha, disse: 
-“Eu estarei lá...” 
E contou-me também de uma orquídea que silenciosamente acompanhou esses momentos de despedida. 
A orquídea, depois que seu pai partiu para o pôr do sol, se recusou a parar de florir... 
Será que o seu pai foi morar na orquídea? 
É possível... 
* * * 
O belo texto de Ruben Alves aborda, com delicadeza, uma temática muito comum nos textos espíritas. 
A Doutrina dos Espíritos tem como arcabouço maior a imortalidade da alma. 
Foram as vozes dos imortais que se fizeram ouvir através da mediunidade segura e confiável de jovens francesas. 
Foram essas vozes que bradaram: 
-A morte não existe! Estamos aqui! Mais vivos do que nunca! Estamos no pôr do sol. 
E foram esses Espíritos, almas que já haviam vivido na Terra, que iniciaram o processo de elaboração da chamada Codificação Espírita. 
A autoria do Espiritismo é dos Espíritos em conjunto com Kardec. 
Foram os seres que já se encontram no pôr do sol que anunciaram verdades confortantes aos amigos encarnados na Terra. 
A orquídea que nunca deixa de florir é similar à alma humana. 
Nunca deixa de existir, nunca deixa de crescer e florescer. 
Haverá dia em que iremos encarar a morte de forma diferente. 
Uma separação temporária que, às vezes, nem mesmo separação o é – se considerarmos que entre almas não necessita haver afastamento. 
O amor não se perde nunca, pois ele não está no outro, está em nós. 
O ser amado ora está aqui, ora acolá, nesses tantos ir e vires da vida, mas isso não faz o amor fenecer nem desistir de amar. 
O amor, por ser criação de Deus - como tudo, nEle confia sempre. 
Nele se fortalece. 
Que as inevitáveis separações da vida possam ser vistas de ângulos diferentes daqueles de sempre. 
Não perdemos ninguém, pois a ninguém possuímos na verdade. 
Ninguém deixa de existir, pois a morte não existe. 
É apenas um momento de transição de um estado de vida para outro.
Todos vivem. 
Todos viveremos. 
Redação do Momento Espírita, inspirado no texto O pôr do sol e a orquídea, do livro Ostra feliz não faz pérola, de Ruben Alves, ed. Planeta.
Em 16.1.2024.
http://momento.com.br/pt/index.php

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