sexta-feira, 5 de janeiro de 2024

LIÇÕES DA MORTE

Você partiu num dia de primavera. 
O sol gargalhava raios de luz e as flores portavam coloridos vestidos de veludo e seda. 
Era feriado e a notícia me chegou, atingindo-me em cheio o coração. 
Senti como se um punhal se cravasse em meu peito e dilacerasse o órgão cardíaco. 
Por alguns instantes, sequer consegui algo balbuciar. 
O impacto da morte súbita, o acidente brutal, eram tantas informações chegando, aos atropelos, que meu cérebro parecia desejar concatenar ideias, sem conseguir, de imediato. 
Na sequência, foram as providências, e tantas eram, para serem diligenciadas. 
Esteio dos familiares, fiz-me fortaleza moral enquanto ansiava por derramar lágrimas, chorar intensamente. 
Apenas isso. 
Sim, eu sabia da vida que não morre, da Imortalidade do Espírito, da vida do Mais Além. 
Contudo, a rapidez com que tudo aconteceu, me surpreendeu. 
Em verdade, é assim: nunca aguardamos que a morte nos venha bater à porta. 
E, no entanto, nada há de mais preciso. 
Receber os amigos, os parentes, os colegas de trabalho, providenciar flores, o sepultamento, tudo me foi tomando as horas. 
Mas, então, parei.
E quando parei, ouvi a passarada orquestrando uma sinfonia. Indaguei-me como podia haver tanta alegria lá fora se meu coração estava tão triste.
Cheguei à janela e observei o quadro de tantos outros dias. 
O jardim exalava perfumes, o vento bailava entre a ramagem dos arbustos, a passarada brincava. 
Um beija-flor, em seu espetacular voo, visitou uma e outra flor. 
Pareceu pairar no ar, como em êxtase. 
Sim, eu sofria. 
Mas Deus continuava a derramar as Suas bênçãos pela Terra. 
Pensei em quantos, como eu, sofriam a perda física de um amor. 
Pensei em tantos outros que, entre risos e emoção, recebiam um novo ser entre seus braços. 
Vida. 
Morte. 
Renascimento. 
E, então, aprendi a primeira lição da morte: a orquestra da vida não para de tocar porque um músico se vai. 
O concerto prossegue. 
E prossegue porque a vida se renova incessantemente. 
Enquanto penso, escrevo e falo, quantas transformações ocorrem em mim. 
Células morrem, são repostas.
E eu continuo a trabalhar, a agir, a amar. 
Segunda lição da morte: o amor não morre quando o amado transpõe o portal da morte. 
O amor é imortal e acompanha o amado em sua peregrinação pela Espiritualidade. 
Então, orei. 
Orei por mim, pelos que ficamos abraçados à pauta da saudade, por você que alçava voo para espaços mais amplos. 
E aprendi a terceira lição: a oração nos une onde quer que nos encontremos. 
Ela estabelece a ligação entre as almas, a comunhão entre os Espíritos. 
E, além disso, dulcifica a imensa saudade, acarinha a face da esperança do reencontro. 
Reencontro breve, nas asas do sonho ou um pouco depois, quando eu também transpuser a aduana da morte e adentrar pelos portões da vida maior. 
Por isso, digo: 
-Até breve, amor!
Redação do Momento Espírita. 
Em 31.10.2012.

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