quinta-feira, 24 de março de 2016

A CANÇÃO DA SOBREVIVÊNCIA

Existem pessoas que reclamam condições para a realização de tarefas. Há as que se desculpam por não mais terem progredido, galgado altos degraus porque lhes faltaram melhores oportunidades. Entretanto, a engenhosidade humana não tem limites e quando o Espírito deseja, concretiza seus anseios, embora os embates de fora, as agressões, as adversidades. Durante a Segunda Guerra Mundial, num imundo campo de concentração em Sumatra, um bando de mulheres magras e desnutridas foram se sentindo sempre mais fracas. Até que idealizaram algo que as pudesse aliviar da tortura do aprisionamento e das péssimas condições de alimentação e higiene. Foi em dezembro de 1943 que as prisioneiras principiaram a serem avisadas que suas colegas promoveriam um concerto. Ao ar livre, em um espaço cercado, a multidão de crianças e mulheres se apinhou. Alguém escreveu no chão sujo: Orquestra. As participantes foram entrando, uma após a outra, cada qual portando um banquinho e algumas folhas de papel. Nenhum instrumento à vista. Estranha orquestra. Seria uma brincadeira engendrada pelos guardas brutais, com o fim único de abater o ânimo, já tão escasso daqueles seres sofridos? Então, uma missionária presbiteriana, magra, com grossas lentes, destacou-se do grupo miserável de vestidos remendados e gastos, de pés descalços, cabeças raspadas e ataduras nas pernas e nos pés, para cobrir as feridas. Sua voz soou clara, como um arauto de boas novas: Esta noite vocês ouvirão um coro de vozes femininas produzindo música, geralmente executada por orquestras. Fechem os olhos, imaginem-se num teatro imponente e ouçam a música imortal. As prisioneiras passaram a imitar o som da orquestra. Num crescendo, as sinfonias invadiram o pavilhão. Pelas mentes cansadas das mulheres que ouviam, as imagens se sucediam como por encanto. A Pastoral do Messias do compositor Handel evocou o Natal, um prelúdio do polonês Chopin reavivou lembranças de um amor que um dia existira na fase do namoro e do casamento de muitas delas. O som de violinos podia ser ouvido. Em certo momento, o guarda de baioneta no rifle, furioso, investiu contra o grupo. No exato momento, o coro atingiu o auge de sua apresentação e ele permaneceu imóvel, como que hipnotizado pelos acordes vocais. Por mais três ou quatro vezes, o coro fez concertos. A música lhes renovava as esperanças e o sentido de dignidade humana. Quando cantavam, esqueciam que se encontravam num campo de concentração, entre ratos e mau cheiro. Suas almas alçavam o voo da liberdade e em suas asas conduziam as companheiras. Além das cercas, dos maus tratos, elas andavam nos campos, aspiravam o perfume das flores, adentravam salões de festa, teatros e participavam do grandioso concerto. Seu canto as levava para muito além dos muros, da miséria e do desamor.
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Você tem na garganta uma flauta mágica, disposta por Deus, para a modulação da canção da paz. Use-a, todos os dias, para executar a sinfonia da esperança aos ouvidos dos aflitos e ciciar doces melodias para os corações em desesperança. Una-se a outras vozes e à orquestra Divina que se chama amor. 
Redação do Momento Espírita, com base no artigo Canção da sobrevivência, da Revista Seleções do Reader´s Digest, de fevereiro de 1998. Em 19.7.2013.

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