sábado, 30 de abril de 2022

A HORA DA MORTE

Michael Tan
De todas as certezas que pode ter o ser humano, a morte é sem dúvida uma delas. 
Quem nasce já está fadado à morte. 
Mensageira estranha, por vezes, abraça antes os mais jovens e os mais sadios, deixando para trás idosos e doentes.
Contudo, sempre chega. 
Paradoxalmente, é um dos assuntos que quase todo mundo evita tocar. 
É por isso mesmo que, quando chega, sempre surpreende.
Também por esse motivo, muitas lágrimas são derramadas sobre os túmulos. 
Lágrimas que se casam a exclamações como:
“Ah, se eu soubesse que era o seu último dia! Se eu soubesse que ele iria morrer, não teria sido tão mau! Se eu soubesse que ele partiria tão cedo, teria abraçado mais, dito como o amava, sido melhor para ele.” 
Por tudo isso, é bom considerar que nossa existência é muito efêmera. 
Hoje estamos aqui, amanhã poderemos não nos encontrar mais deste lado da vida. 
O ser amado que se despede para o trabalho diário, pode não retornar. 
A criança que corre pela rua, rumo à escola, pode não voltar para casa. 
Como a irmã daquele menino de apenas 10 anos. 
Ele entrou em casa e chamou pela mãe. 
Ela estava no quarto, sentada, quieta. 
-“Sua irmã morreu esta manhã, Michael.” – foi o que disse. 
O conceito de morte não tinha um significado concreto para aquele garotinho. 
Durante muito tempo ele perguntava à mãe: 
-“Ela vai voltar?Por que ela teve de morrer?” 
E ficava em frente à casa, esperando que o ônibus escolar a trouxesse de volta. 
Entrava no quarto dela e apanhava a sua pasta escolar. 
Tudo estava bem arrumado – os cadernos de um lado, os livros do outro, o estojo de lápis no meio. 
A faixa preta de elástico que ela usava nos cabelos quando foi para o colégio naquela manhã. 
Depois, devolvia tudo certinho no seu lugar. 
Perguntava-se, se a irmã ficaria zangada por ele ter mexido em suas coisas. 
O que ele realmente jamais esqueceria foi o que aconteceu duas noites antes da irmã morrer. 
Ele esperou o ônibus que a trazia da escola. 
Estava preocupada. 
Esquecera de um trabalho de arte que devia entregar no dia seguinte. 
Ele a foi ajudar e juntos fizeram 12 borboletas coloridas, de antenas enroladas e asas triangulares. 
No dia em que ela morreu, ele estranhamente despertou mais cedo. 
Observou-a se aprontando para a escola. 
Como o vão da escada no prédio era muito escuro, ele ficou segurando a porta aberta para que a luz do apartamento a ajudasse enxergar os degraus. 
Uma das mãos dela segurava a pasta, a outra balançava, enquanto descia os degraus. 
Estava de uniforme azul. 
Tinha só 14 anos. 
E suas últimas palavras para Michael foram:
-“Até logo, irmão.” 
Passadas mais de 4 décadas, Michael ainda guarda a lembrança de sua irmã. 
Quando vê uma borboleta, recorda de imediato daquele último trabalho que fizeram juntos. 
E espera. 
Porque, um dia, ele também fará essa viagem para o grande além. 
Nesse dia, finalmente, ele a verá outra vez. 
 *** 
Ame muito. 
Usufrua a companhia dos afetos. 
Quando um deles se for, poderá acalentar seus dias com as doces lembranças dos afagos compartilhados. 
E isso amenizará sua grande saudade. 
Texto da Equipe de Redação do Momento Espírita com base no artigo A despedida, de Michael Tan, da revista Seleções do Reader´s Digest, outubro/2005.

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