quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

ALÉM DO TEMPO

Seguiam a nossa frente. Passos vagarosos, cadenciados. Mãos dadas. As cabeças nevadas e a lentidão do passo lhes denunciavam a idade avançada. Um homem. Uma mulher. Um casal de idosos. De mãos dadas, enamorados. As mãos seguravam firme, como a dizer que um se constituía no apoio do outro. Assim no físico, assim no afeto. Ficamos a imaginá-los, na esteira do tempo, jovens, rindo e correndo pelo parque, sob as bênçãos do sol. Brincando no lago, jogando água um no outro, gargalhando. Pudemos quase vê-los, de forma nítida, abraçados, quietos, olhando enlevados o concerto da primavera em flor, mãos entrelaçadas, cabeças apoiadas, tecendo sonhos e fantasias. Terão imaginado quiçá que alcançariam esta idade, unidos? São eles mesmos. Atravessaram os anos e prosseguem apaixonados. Casaram, tiveram filhos, passaram as mil dificuldades de educar, instruir e amar a prole, renunciando muito a benefício deles. Quando os filhos se foram, um a um, como aves de arribação, deixando o ninho para construir o seu próprio e eles ficaram sós, souberam retomar o enlevo dos primeiros dias. O segredo dessa união sólida? O amor. Só o amor tem o poder de atravessar os anos e se tornar mais intenso. Só ele pode enfrentar com dignidade o encarquilhar das mãos, o aparecimento das rugas, o andar mais demorado. Somente ele, porque possui lentes especiais, que transcendem o físico e alcançam a alma. Relação assim regida prossegue para além da vida corpórea. Um parte como flor que fenece ao vento gélido e fica aguardando o outro. Enquanto espera o amado, a sua é a tarefa de amparar, zelar pelo que ficou nas estradas do mundo. Nas noites de solidão, fala-lhe à intimidade do logo mais e insufla-lhe coragem para não se abater ante os percalços que lhe faltam vencer. Aguarda-o, no mundo espiritual, como o noivo espera a amada, em dia festivo. E, quando, finalmente, chega o dia da partida, prepara-lhe a chegada e o retoma nos braços em suave amplexo demonstrando que o amor vence a dor, o sofrimento e a morte. Muitas almas que assim se amam, na Terra, intensamente, retornam mais tarde, em nova roupagem, novamente juntos e, porque amam verdadeiramente, unem-se outra vez para idealizar grandes coisas a bem da comunidade. É dessa forma que encontramos casais na ciência, na arte, na devoção ao semelhante, doando-se muito além do dever. Tendo experienciado o amor na sua essência mais profunda aprenderam que quanto mais ele se divide, mais se multiplica. 
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Você sabia que Amélie Gabrielle Boudet, a senhora Kardec, esposa do Codificador do Espiritismo, após a morte dele viveu ainda por quatorze anos? Enquanto ele esteve encarnado, ela lhe foi a companheira fiel de todas as horas, em todas as suas atividades, fossem as pedagógicas ou as dedicadas à Doutrina Espírita. Desencarnou aos oitenta e sete anos, lúcida e ativa, devotada à causa do Espiritismo. 
Redação do Momento Espírita. Disponível no livro Momento Espírita, v. 8, ed. FEP. Em 29.10.2014.

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