segunda-feira, 6 de outubro de 2014

VIVER NÃO DÓI!

Carlos Drummond de Andrade

Definitivo, como tudo o que é simples. 
Nossa dor não advém das coisas vividas, 
mas das coisas que foram sonhadas 
e não se cumpriram. 
Por que sofremos tanto por amor? 
O certo seria a gente não sofrer, 
apenas agradecer por termos conhecido 
uma pessoa tão bacana, 
que gerou em nós um sentimento intenso 
e que nos fez companhia por um tempo razoável, 
um tempo feliz. 
Sofremos por quê? 
Porque automaticamente esquecemos 
o que foi desfrutado e passamos a sofrer 
pelas nossas projeções irrealizadas, 
por todas as cidades que gostaríamos 
de ter conhecido ao lado do nosso amor 
e não conhecemos, por todos os filhos que 
gostaríamos de ter tido junto e não tivemos, 
por todos os shows e livros e silêncios 
que gostaríamos de ter compartilhado, 
e não compartilhamos. 
Por todos os beijos cancelados, 
pela eternidade. 
Sofremos não porque nosso trabalho é desgastante 
e paga pouco, mas por todas as horas livres 
que deixamos de ter para ir ao cinema, 
para conversar com um amigo, 
para nadar, para namorar. 
Sofremos não porque nossa mãe 
é impaciente conosco, 
mas por todos os momentos em que 
poderíamos estar confidenciando a ela 
nossas mais profundas angústias 
se ela estivesse interessada 
em nos compreender. 
Sofremos não porque nosso time perdeu, 
mas pela euforia sufocada. 
Sofremos não porque envelhecemos, 
mas porque o futuro está sendo 
confiscado de nós, impedindo assim 
que mil aventuras nos aconteçam, 
todas aquelas com as quais sonhamos e 
nunca chegamos a experimentar. 
Como aliviar a dor do que não foi vivido? 
A resposta é simples como um verso: 
Se iludindo menos e vivendo mais!!! 
A cada dia que vivo, 
mais me convenço de que o 
desperdício da vida 
está no amor que não damos, 
nas forças que não usamos, 
na prudência egoísta que nada arrisca, 
e que, esquivando-se do sofrimento, 
perdemos também a felicidade. 
A dor é inevitável. 
O sofrimento é opcional.

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